quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

É confortável - Parte II

Esta é uma continuação de "É confortável - parte I"



O desejo não tem idade, não tem cor, não tem gosto, não tem cheiro. Engana-se quem pensa que os velhinhos são todos como dona Angelique, que vive à espera do dia em que a morte bater em sua porta.

Naquela manhã dona Angelique entendeu o que é atração.

É com a atração que tudo começa. Essa palavra tão pequena provoca o primeiro beijo, a carona para casa, o convite para um jantar. É com a atração que o amor acontece, que o sexo acontece, que o compromisso acontece, talvez isso justifique o faturamento de R$21 bilhões da indústria de cosméticos em 2008, conforme a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) . As pessoas procuram ficar bem para as outras, procuram se sentir belos.

Dona Angelique não tinha mais jeito, não havia cirurgia que melhorasse aquele rosto horrível. Mas naquela manhã ela não pensou muito nisso. Apenas admirou o monumento humano que ao correr parecia que dançava levemente sobre as nuvens.

Ela desejou. Nunca havia sentido isso, nem com seu falecido marido. O desejo corria por suas veias, passava por todos os seus órgão e por dois minutos se sentiu no céu, como se estivesse correndo com seu anjo sobre as nuvens.

O tempo começou a fechar e com a queda da primeira gota de chuva voltou à realidade, foi para casa e antes mesmo de sair do parque já pensava em antecipar a caminhada no dia seguinte.



* Continua

sábado, 24 de janeiro de 2009

Sonho

Mal fechou os olhos e começou a sonhar. No primeiro sonho as pessoas estavam com traje espacial dentro de casa, quando de repente um ser conhecido como Mandalagueta passou pela porta da sala. Rita pegou sua super arma com raio contra Madalagueta e disparou contra o terrível ser, que resistiu e ainda se multiplicou, criando diversos Madalaguetas, cada vez mais resistentes e terríveis.

Rita decidiu aproveitar o último insucesso culinário, que estava tão ruim que nem a mãe dela conseguiu provar. Era uma bebida que ficou verde e muito ácida. Sugeriu que sua mãe Coralina pulasse a janela do segundo andar do sobrado, exatamente da sala onde estavam. Coralina e o covarde marido de Rita saltaram pela janela e Rita jogou o suco nos Madalaguetas que desapareceram para sempre.

O povo da cidade fez festa (tinha umas sete pessoas). Tirando o suco horrível que apareceu no sonho tudo certamente era irreal. Rita era solteira e sua mãe se chamava Ana. Usava óculos, tinha caspa no cabelo e não tinha sete pessoas na lista de contatos do celular e foi quando Rita decidiu mudar, queria ter uma cidade inteira festejando seus sucessos contra o mal.

Decidiu fazer academia, ficar forte, aprender artes marciais e depois de anos pediu para sua mãe costurar uma "fantasia" para ir a uma festa. Rita sabia que assumiria uma identidade secreta e nem sua mãe, única conhecida e amiga que tinha poderia saber que ela era a Super Super.

Não escolheu um nome muito criativo pois a criatividade se perdeu logo no seu nascimento. Inteligência ela tinha e como uma Super Super deve saber voar, Rita desenvolveu um turbo que a mantinha sobrevoando a cidade por até 30 minutos. Tempo suficiente para mudar de lugar e tirar a sua roupa de Super Super.

Rita acordou e continuou com sua vida pacata.


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quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

É confortável - Parte I

Esse tal amor nos prega peças ao longo da vida. Um dia ele aparece puro e inocente e fica no portão de casa, com medo do flagrante pelo pai ou pela mãe. Aos poucos ele amadurece e nunca sabemos se o assunto tratado é o mesmo, nem sempre reconhecemos o que é o amor. Nos enganamos, nos enganam e em todo este período ele aparece em diversos aspectos.

De acordo com os dados do Registro Civil fornecido pelo IBGE, 17.349 pessoas se casaram em Curitiba em 2007, durante o mesmo período 1.987 divórcios foram concedidos e entre tantas pessoas poderia estar dona Angelique, mas não se divorciou, muito menos casou.

Aos 50 anos dona Angelique lembrava que já teve três namorados, um marido, quatro filhos e sete netos durante sua vida e segura de si esperava o dia em que a morte a pegaria pelas mãos e a levaria para sempre, em direção ao desconhecido.

Atualmente 50 anos é pouca coisa, mas dona Angelique se desgastou muito durante a vida. Ao encontrá-la qualquer pessoa daria 65 anos sem temer, pensando em fazer logo um elogio, pois aquela senhora certamente teria mais que isso.

Dona Angelique se tornou uma feia senhora, daquelas que crianças tremem ao encontrar pela rua. No ônibus os bebês choram ao perceber seu olhar seco e árduo.

Com as mãos mais enrugadas que o rosto, dona Angelique segurava a sua bengala e passeava pelo parque São Lourenço naquela manhã. Foi quando o viu correr. Seu coração disparou, segurou firme na bengala, respirou fundo e ajeitou o cabelo, com a esperança de melhorar alguma coisa.

* Continua



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quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Climas ou Curitibas

É bonito ver a terra coberta de dourado. É sempre assim no verão, tudo é enriquecido pela cor e calor do sol. Até mesmo o cinza do asfalto permite que o dourado ganhe destaque.

Com o sol as roupas mais coloridas e frescas saem do armário, tudo fica mais quente. As pessoas ficam mais quentes, se aproximam mais, organizam mais eventos, conversam mais com os antigos amigos, bebem mais, dançam mais. No verão as pessoas ficam mais felizes. Elas parecem mais felizes.

No verão todo o mundo reclama que está muito quente, que chove, que transpira. Além de mais felizes as pessoas reclamam mais.

No inverno o cinza do céu domina todas as cores. O inverno é mais romântico, os jantares são melhores, as pessoas mais elegantes. Elas parecem mais românticas.

E aí reclamam do frio, que sempre está muito frio, que ninguém abre as janelas do ônibus, que precisam colocar muitas camadas de roupa. Além de mais românticas as pessoas reclamam mais.

No inverno as pessoas adoecem mais e reclamam, com todo o exagero possível, que não aguentam ficar tantas vezes doente. Os ossos dos idosos doem mais, de acordo com a intensidade do frio. Quanto mais frio, mais dor.

O mundo pode acabar com sol, chuva, frio, calor e independente da maneira que acabe, sempre terá um bom curitibano reclamando do clima, já que esse é o único assunto por aqui e confesso que o costume me faz pensar que não existe outra maneira de se aproximar de estranhos. Será que há?


Foto: Lida Rose

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009